segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Muitas pessoas, pombos, chão e calor, tudo numa rua só. Aí me encontro, no meio dessa confusão com cheiro de gente e pipoca, e aí está ela também, ela que desconheço de intimidade mas conheço de nome: Maria Thereza. E passa devagar, dentro de um vestido verde florido, não sei se querendo ou não estar ali. Os outros é que não querem que ela esteja. Sei disso pois quem me conta é essa plaquinha branca dependurada no meio das flores do vestido, onde se lê: Maria Thereza – doente auditiva e cega. E leio: Maria Thereza - subproduto social. Maria Thereza - se pudesse ser descartada, há tempos já teria sido. Maria Thereza - produtora e consumidora inativa. Maria Thereza – esperando a morte que não chega e se não traz prejuízo para o governo, traz prejuízo para a família. Não sei o que o crachá grita mais, se é distância ou dó. Aqui tudo tem cheiro de pipoca e gente que espera ônibus e ônibus que não espera gente e tem a Maria Thereza, que todo mundo finge que não tem. O que eu queria mesmo era escrever por essa senhorinha, mas como poderia se o mundo que vê não é o mundo que vejo? Posso estar traindo todo seu viver se disser que enxerga escuridão se, em verdade, vê cores. Então escrevo para ela: Maria Thereza do vestido florido e dos passos pequenos, se este fosse meu mundo você não andaria com esse crachá e nem estaria aqui. Eu te levaria para um lugar bonito, junto dos meus sabiás e da grama com cheiro de chuva. Você, que sem me conhecer nem saber que existo, abre meus olhos que vivem sempre tão fechados. Depois vai embora, tão depressa, e eu fico assim a ver num instante o que os livros não contam, as pessoas não dizem e que o mundo tanto lutou para esconder de mim, de nós e dele mesmo.

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