quarta-feira, 14 de setembro de 2011

frio

O frio está tão bom - eu digo - o céu parece maior quando se está nublado, não é?

Eu caminho, passos largos, talvez querendo adiantar o final, não sei bem. O cabisbaixo não se atreve a rir e o risonho nem pensa em sair de sua humilde posição um tanto quanto inocente que se disfarça de bom senso. (Quanto falta de bom senso havia naquele pedaço de mundo que fiz no instante em que decidi seguir ao lado de vocês! Quanto distanciamento infinito disfarçado de aproximação!) Os segundos correm e eu digo para os dois lados de mim calarem-se.

Não tomem partido, eu sussurro. Não ajam impulsivamente. Não submetam-se a surtos artísticos.

Converse sobre o tempo.

(Estava escrito num livro que li que a única coisa que podemos partilhar com as pessoas é a preferência pelo mesmo tipo de clima, então, é o que faço.)

O frio está tão bom - eu digo - o céu parece maior quando se está nublado, não é?

Não parece. Eu é que quero voar e respirar esse ar rarefeito até que se ardam meus pulmões e eu caia no chão, estática, defunta. Pois, prossigo. Sendo fria com o calor e por demais acalorada com o que me vêm frio.

Então, sem querer, uma parte de mim vai embora. Estou descendo escadas rolantes e, logo em seguida, me encontro em frente a uma doceria onde há um bolo tão macio. Mas tudo que tenho em mãos é um chocolate barato, então, engulo o chocolate mesmo. Engulo-o de qualquer maneira. Não importa, a imagem do bolo faz-se viva naquele ato desgostoso.

Então morro e renasço mais uma vez. Me transformo em um único ser. Não me pergunto quanto tempo aquilo tudo vai durar, vivo pelo tempo. Pouco importa agora o frio. Pouco importa agora o bolo. Pouco importa agora o bolo. Pouco importa agora o bolo.




"Que lindos olhos
Que lindos olhos que você tem
Que ainda hoje
Que ainda hoje eu reparei
Se eu reparasse
Se eu reparasse a mais tempo
Eu não amava
Eu não amava quem amei."







(e fica a cantiga, até que se faça novamente o amanhã)

(seria pudim no lugar do chocolate, como fui bem lembrada, se não fosse demasiado estranho ter um pudim em mãos)