segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Sinceridade

Sentaram-se. A tarde mal-humorada aos poucos se despedia de sua observadora plateia e partia, cobrindo-se de nuvens cinzentas e deixando lugar para a noite que, exibicionista, já reclamava seu espaço. O banco era frio; os rostos próximos. Já chegava a hora de partirem, mas para que, afinal? Então permaneciam. Não havia palavras, tampouco risadas, carícias ou olhares. Havia uma espessa massa de ar embolorado que saía de dentro pra fora, ou seria de fora pra dentro? E consumia cada pedacinho daqueles seres que, silenciosos, aguardavam. A última réstia de luz já tinha ido embora há uma ou duas horas e o vento ia e vinha, incessantemente, balaçando as folículas daquelas plantas de vaso de lá para cá e de cá para lá. Imóveis e silenciosos, os dois permaneciam. O único movimento vinha de dentro deles, forte, rápido, constante. Uma troca de palavras. Esperança desesperançosa, ingrata. O céu já estava tomado de pontinhos brilhantes e uma bola branco-amarelada envolta em fiapos de luz quase transparentes, era a noite exibindo tudo o que tinha de melhor. Eles davam as mãos, e isso era tudo que tinham de melhor. Dar as mãos, puro ato provido de vida. E as mãos tremiam, suavam frio, até elas estavam cheias de medos, incertezas e angústias. Um raio lampeja no céu, obviamente querendo provar que brilha mais que todas aquelas ingênuas estrelinhas piscantes. Eles se entreolharam. Em questão de segundos o pátio começa a girar, primeiro de um lado, depois de outro. Mais raios caem do céu, estonteantes, e surgem brilhando, brancos, azuis, amarelos, verdes e alguns até vermelhos. Os dois corpos permanecem em intensa sintonia. De repente tudo para. Um dos seres respira o ar como se fosse inspirar o mundo, então o pátio volta a ser pátio e o céu volta a ser somente um cobertor de estrelas. Eles se entreolham novamente, o chão frio de pedra parte-se no meio e ambos sentem um estranho aroma úmido de chuva. Estão num rio. Transformam-se, então, em peixes, um vermelho e outro branco. Nadam frenéticamente deixando-se levar pela correnteza que os puxa, cada vez mais forte. Piscam os olhos, uma, duas vezes. Novamente o primeiro cenário se reconstrói. Silenciosos os dois partem, quem sabe se para nunca mais voltar. O pátio permanece frio, seus bancos e plantas reclamam solidão. Solidão sem dor. O que resta aos seres é a plenitude. Só isso. Fora embora a angústia, o medo e a incerteza do desejo reprimido. O que restou foi um quase alívio do sedento que encontra a fonte de águas transparentes. Um dos seres caminha junto às gotas de chuva que respingam em seu rosto. Então, para e olha para a palma de sua mão. As linhas traçadas parecem mais fortes e ele acredita que, sendo obra do destino ou não, dessa vez eles haviam acertado.